domingo, 28 de agosto de 2011


Anemia falciforme é discutida em audiência pública

Uma a cada 380 crianças nascidas vivas é portadora da anemia falciforme nas Américas. Segundo o Ministério da Saúde (MS), a cada ano o Brasil registra cerca de três mil nascimentos de crianças com a doença que afeta especialmente negros. A situação é considerada pelo MS um problema de saúde pública devido à grande parte da população do país ser negra e mestiça. Em audiência realizada no Senado Federal, na última quarta-feira (24), senadores debateram sobre incidências, qualificação para o atendimento de pacientes e a divulgação da doença para conhecimento da sociedade.

Solicitada pelos senadores Lídice da Mata, Paulo Paim (PT-RS) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), a audiência foi promovida pelas Comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado.

Joice Aragão de Jesus, coordenadora da Política de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme do MS, destacou que a enfermidade atinge uma parte da população que, além de negra, é mais vulnerável: mais pobre, que não tem acesso a uma série de serviços e com menor grau de escolaridade.

Prevenção e combate - De acordo Joice, é grande a necessidade de uma campanha de conscientização para que as pessoas saibam o que é e como conviver com a doença. “A anemia falciforme é hereditária e não tem cura, mas existem tratamentos que dão ao doente o direito a uma vida com qualidade e que proporciona à família maior segurança”, afirmou a médica que aposta no avanço da ciência em relação a tratamentos para a doença.

A senadora Lídice da Mata (PSB-BA) propôs a criação de um cadastro nacional que possibilite estratégias governamentais e acompanhamento médico mais adequados a fim de reduzir os índices de mortalidade. Os dados sobre a doença no país ainda são precários, porém o MS aponta que a letalidade para crianças portadoras até cinco anos de idade é de 80% quando não há tratamento algum, e de 1,8% quando há o tratamento.

Racismo Institucional – Representante da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Anhamona Silva de Brito, e Altair Lira, coordenador geral da Federação Nacional das Associações de Doenças Falciformes, defenderam durante o encontro que o racismo institucional está entre as razões que explicam a demora do governo em priorizar nas políticas públicas, uma doença que afeta parcela significativa da população. “A doença que foi descoberta há um século e ainda não se sabe exatamente o que é. Isso comprova o racismo institucional que há na saúde”, ressaltou Lira que é pai de uma menina portadora da doença.

Zezé Mota, que esteve na audiência comentou de seus esforços para divulgar a questão na mídia. Sem sucesso nas tentativas, a cantora e atriz lamentou a falta de interesse dos meios de comunicação em divulgar um problema que a sociedade brasileira mal conhece.

Histórico e incidências – A anemia falciforme é herdada dos pais. É uma doença incurável, decorrente de alteração sofrida pelo código genético. A coordenadora da Política de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme do MS, explica que a mutação faz com que as hemáceas (células vermelhas do sangue) percam sua sustentabilidade e, assim, sua forma redonda, assumindo o formato de foice, o que explica o nome da doença. A dor e a anemia aguda são os principais sintomas.

Estado brasileiro com grande número de ascendentes de africanos, a Bahia tem o maior percentual de casos, registrando um portador para cada 650 crianças nascidas vivas. Outros estados com as mais altas incidências são Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco e Maranhão.

Originária da África, a anemia falciforme foi uma mutação para adaptação à questões ambientais ocorridas que vitimou os povos do continente. Com a diáspora, se espalhou pelo mundo e se tornou herança genética nas populações afrodescendentes da Europa, Índia, Estados Unidos e América Latina. Para se ter idéia da proporção por continente, enquanto no Brasil nascem três mil portadores por ano, na Nigéria nascem 86 mil no mesmo período, seguido de Congo e Serra Leoa.

Teste do pezinho – Ferramenta fundamental para a segurança do bebê e da família o “teste do pezinho” tem sido uma importante ferramenta na triagem neonatal. Por meio do método, é possível o diagnóstico precoce da enfermidade e de outras doenças, o que permite que a doença, apesar de incurável, seja tratada de forma adequada logo que a criança nasce, evitando uma série de complicações e a morte.

Na proposta da senadora Lídice, o “teste do pezinho” poderia servir de instrumento ao cadastro nacional de informações sobre a doença. Joice, do MS esclareceu que 18 estados do país já oferecem gratuitamente o exame no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) para detecção da anemia falciforme. Nos outros estados o teste gratuito existe, porém não inclui a enfermidade entre as doenças diagnosticadas.

Fonte: Palmares (Daiane de Souza)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011


Com comércio em alta, Brasil e África desenvolvem parceria com ganhos para todos

A corrente de comércio entre Brasil e África atingiu a marca de 17 bilhões de dólares em 2009. Porém, a relação entre brasileiros e africanos vai além disso, envolvendo parcerias para desenvolvimento e capacitação. Neste contexto, representantes de 14 países discutem o papel da propriedade intelectual para ampliar mais esta relação, inclusive em setores econômicos de ponta.
As discussões fazem parte do Encontro Inter-Regional Brasil - África de Propriedade Intelectual para o Desenvolvimento Econômico. O evento é promovido por uma parceria entre o INPI e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), com apoio do Ministério das RelaçõesExteriores (MRE). O evento ocorre entre os dias 19 e 20 de agosto, em Salvador (BA).
Na abertura do evento, os debates focaram a cooperação entre as instituições nacionais de propriedade intelectual para garantir agilidade e qualidade na concessão de direitos, além de ampliar o ensino e a pesquisa sobre o tema. Isso estimularia o uso do sistema de PI por pesquisadores e empresas, que também podem fazer parcerias entre si.
Desta forma, para o presidente do INPI, Jorge Ávila, e o vice-diretor geral para Cooperação e Desenvolvimento da OMPI, Geoffrey Onyeama, a colaboração é importante para gerar um sistema de propriedade intelectual que contribua para a inovação e o desenvolvimento de todos.
Neste sentido, o assessor internacional do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) José Mauro Couto, lembrou que a intenção brasileira é constituir parcerias de longo prazo com o continente africano, incluindo transferência de tecnologias e know how.
Alguns exemplos reforçam este modelo. A Embrapa, por exemplo, possui projetos com diversos países africanos, como Angola, Moçambique, Gana, Gabão e Nigéria, entre outros. E a tendência é ampliar ainda mais os acordos, já que o mundo tem cerca de 14 milhões de hectares disponíveis para agricultura, boa parte deles na América do Sul e na África. Neste processo de desenvolvimento conjunto, a propriedade intelectual é um requisito decisivo.
Já a Fiocruz, que possui escritório em Moçambique, realiza ações de capacitação de pessoal e de intercâmbio técnico-científico, especialmente nos países de Língua Portuguesa. Umdos projetos de cooperação está voltado para o combate à Aids.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011



‘Sentem fome, mas não pedem
comida o tempo todo’



Os somalis não possuem a mesma noção de fome que temos no Brasil”, conta a pediatra carioca Luana Lima, em uma conversa com o site de Carta Capital, por telefone, do campo de refugiados de Dadaab, no Quênia. O local recebe um intenso fluxo de refugiados da Somália em busca de alimentos e ajuda médica, somando 440 mil pessoas e com previsão para alcançar 550 mil até o fim do ano.

Quatro entre dez crianças de até cinco anos que chegam a Dadaab estão desnutridas. Veja relato de médica carioca que está no local. Por Gabriel Bonis Foto: Brendan Bannon

“No hospital, oferecemos alimento oito vezes para uma criança. Então a mãe dela me disse que seu filho não precisava comer tudo aquilo e que deveria dividir com os outros”, lembra a pediatra, que trabalha na unidade de tratamento de desnutrição do hospital da organização internacional Médicos Sem Fronteiras.


“Eles nunca foram acostumados a ter comida e sua dieta é diferente, então não chegam a ter essa noção de que não possuem tanta comida. Logicamente, sentem fome, mas não pedem comida o tempo inteiro”, explica.

Nos campos de Dadaab, após serem registrados em postos de controle, os refugiados recebem alimentos – providenciados pelo Programa Mundial de Alimentação da ONU – de acordo com os casos clínicos: crianças mal nutridas ganham mantimentos específicos com maior valor calórico e acompanhamento de “agentes comunitários”, que visitam as tendas também colhendo dados.

Essas informações serão compiladas em uma pesquisa do MSF, que ainda não tem níveis de mortalidade no campo disponíveis. “Precisamos saber o que está acontecendo, porque acreditamos que mais pessoas do que podemos alcançar estão morrendo. Precisamos nos focar em salvar vidas e nas formas de alcançá-las”, afirma a coordenadora médica da missão da MSF em Dadaab, a espanhola Natalia Cobo.

No local, a organização está fornecendo tratamento médico em dois dos quatro campos de refugiados, mas a condição está piorando. Cobo chega a comparar a situação no Quênia com a dos deslocados internos em Darfur, no Sudão, onde esteve em 2005 e 2008. “Em Darfur, tínhamos apoio psicológico para a população, laboratórios, enfim, era um hospital completo. Aqui, a dimensão das necessidades é muito alta. Estamos falando de quase 400 mil pessoas, é quase uma cidade”.

Uma configuração populacional que traz problemas comuns aos grandes centros urbanos, como a violência, a um local já atingido pela miséria. “Sabemos que há alguns bandidos em volta dos campos e há violência. Sabemos que no caminho homens estupram mulheres, além disso, nos extremos do campo é difícil controlar esses casos”.

Acompanhe abaixo mais imagens do campo de refugiados em Dadaab:



Refugiados da Somália se acumulam na entrada do centro de recepção em Dadaab. Foto: Michael Goldfarb



Com os campos lotados, refugiados somalis fazem assentamento improvisado. Foto: Michael Goldfarb



Cerca de seis mil pessoas chegaram ao campo de refugiados de Dadaab na segunda semana de agosto.


Foto: Michael Goldfarb/MSF

Paciente é examinado no centro de alimentação terapêutica no hospital de um
dos campos de refugiados de Dadaab. Foto: Michael Goldfarb



Criança sendo pesada em um dos postos de saúde gerenciados pelo MSF em Dadaab. 
Foto:Serene Assir

Enfermaria do centro de alimentação terapêutica no hospital de MSF em Dadaab. Foto: Michael Goldfarb
Em direção ao Quênia, somalis lotam campo de refugiados. 'As tendas aparecem e já não reconhecemos os endereços', conta médica carioca Luana Lima. 
Fotos: Michael Goldfarb/MSF
Fonte: Carta Capital

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

ONU condena País por morte de grávida

Para entidade, Brasil violou direitos humanos de gestantes; mulher de 28 anos morreu em 2002

O Brasil foi condenado pela Organização das Nações Unidas (ONU) por violar direitos humanos de grávidas. A determinação foi divulgada ontem pelo Comitê para Eliminação da Discriminação contra Mulheres (Cedaw, sigla em inglês).

O caso que levou a essa decisão é o da brasileira Alyne Silva Pimentel, de 28 anos, moradora da Baixada Fluminense (RJ). Ela morreu em novembro de 2002, no sexto mês de gestação, cinco dias após dar entrada em um hospital público com sinais de gravidez de alto risco não receber atendimento apropriado.

"A Justiça no Brasil nunca deu resposta. O caso chegou à ONU em 2007 e hoje saiu a decisão. O resultado é uma vitória do Brasil e do mundo, já que é o primeiro caso de mortalidade materna analisado internacionalmente", explica Lílian Sepúlveda, vice-diretora do Center for Reproductive Rights, organização que promove os direitos reprodutivos das mulheres no mundo e levou o caso ao Comitê da ONU.

Obrigações. A decisão estabelece que o governo brasileiro deve indenizar a família de Alyne, além de garantir o direito das mulheres aos cuidados obstetrícios de emergência, oferecer formação profissional adequada aos profissionais da saúde e punir aqueles que violarem os direitos reprodutivos das mulheres.

Ainda não foi divulgado o valor da indenização nem o prazo para pagamento.

"A decisão é importante, pois combate uma múltipla discriminação, já que Alyne era mulher, negra e pobre", completa Lilian.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), apesar de ter reduzido a taxa de mortalidade materna na última década, o Brasil ainda é responsável por cerca de 20% das mortes de grávidas que ocorrem todos os anos na América Latina e no Caribe. Brasileiras afrodescendentes, indígenas e mulheres solteiras vivendo nas regiões mais pobres são proporcionalmente as mais afetadas pela mortalidade materna.

Em nota, o Ministério da Saúde afirma que o programa Rede Cegonha, lançado em março deste ano com um investimento de R$ 9,4 bilhões, vai ditar ações estratégicas para qualificar uma rede de assistência obstétrica. O objetivo é que a mulher receba assistência integral desde a confirmação da gravidez e até o segundo ano de vida do filho.

Consequências. Quando morreu, Alyne deixou uma filha de 5 anos. Um tempo depois, o pai da criança saiu de casa e formou uma nova família. A criação da menina ficou por conta da avó, Lourdes Silva. "Esperei por nove anos. Eu quase já não tinha esperança de que algo acontecesse."

Após a morte de Alyne, a filha ficou gaga, perdeu o apetite, precisou ser trocada de escola e até hoje recebe atendimento de fonoaudióloga e de psicóloga. Tudo pago pela avó.

Além da determinação da ONU, a família espera decisão da Justiça brasileira que lhe garanta o direito de reparação.

PARA ENTENDER

Era 12 de novembro de 2002, quando Alyne Pimentel Teixeira, grávida de seis meses, chegou à Casa de Saúde Nossa Senhora da Glória, em Belford Roxo, no Rio. Com náuseas, voltou para casa com a prescrição de um remédio. Retornou no dia seguinte ao local e foi internada. Uma ultrassonografia mostrou que o feto estava morto e o parto foi induzido. Dois dias depois, a família foi informada de que Alyne tinha hemorragia e não conseguia respirar. Transferida de hospital, morreu no dia seguinte. 

Fonte: O Estado de S.Paulo (Ocimara Balmant )