sexta-feira, 12 de março de 2010

A farsa da vacina de 10 bilhões de dólares de Bill Gates
Thomas C. Mountain

O homem mais rico "do mundo", o dono da Microsoft, Bill Gates, anunciou recentemente que vai doar 10 bilhões de dólares para investigar vacinas que previnam algumas das piores doenças do mundo.A malária é o assassino número um da África. Segundo entendi, cerca de um bilhão de dólares da doação livre de impostos de Bill Gates será destinada à investigação de uma vacina contra a malária.Nos últimos sete anos, na Eritréia, país africano onde eu moro, caiu 85% a mortalidade causada pela malária. Como? Usando métodos básicos de saúde pública, distribuindo redes mosquiteiras tratadas com pesticidas, que voltam a ser tratadas a cada sete meses, através da erradicação no habitat e por meio das clínicas comunitárias de tratamento imediato.

A malária é uma doença transmitida por um parasita e é conhecido por sua variedade e rápido desenvolvimento de resistência às medicações. Mesmo quando bilhões de dólares pudessem produzir uma vacina, esta teria uma duração limitada e em poucos anos seria preciso levar aos pobres da África novos medicamentos patenteados.

Portanto, "doar" um bilhão de dólares para desenvolver uma vacina para combater a malária pode transformar-se em dezenas de bilhões de dólares em vendas de fármacos só na África e, através do investimento em empresas farmacêuticas, Bill Gates embolsará tranquilamente mais dinheiro africano ensaguentado.

Enquanto isso, na Eritreia está funcionando com muito sucesso um programa eficiente, seguro e acessível na redução da mortalidade.

Por que não lhe é dada publicidade a nível internacional? Será porque este programa não irá fornecer bilhões de dólares aos barões dos fármacos das finanças ocidentais?

Através de seu controle dos meios de comunicação ocidentais e das organizações de "ajuda" , Bill Gates e outros tantos terroristas das finanças estão suprimindo a implementação de um programa contra a mortalidade por malária que funciona, ao mesmo tempo que investem na adição aos fármacos contra a malária dos africanos.

Estes terroristas financeiros estão completamente desejosos de ver morrer milhões de pessoas na África enquanto pesquisam seu próximo "remédio milagroso" extremamente benéfico para a cura da malária, e ignoram deliberadamente, ou pior, tramam uma maneira de ocultar o que poderia prevenir milhões de mortes, para não dizer de um sofrimento indescritível.

E a Aids, o assassino número dois na África? Diz-se que Bill Gates irá fornecer mais de um bilhão de dólares para investigar uma vacina contra a Aids. Esta doença baseada em um vírus já demonstrou ter variedades e ter desenvolvido resistência aos medicamentos criados para tratá-lo. Como a vacina contra a gripe, é provável que em poucos anos teria que ser desenvolvida uma nova vacina contra a Aids para lutar contra as últimas cepas do vírus; uma mina de ouro para vender medicamentos novos e patenteados aos doentes da África.

De acordo com Médicos pela Paz, a Eritreia reduziu em 40% a taxa de infecção pelo HIV e é o único país africano que reduziu a Aids. Como? Utilizando em todo o país educação em saúde pública que promove o uso do preservativo. Mais de um bilhão de dólares para uma vacina que pode ser que não funcione nunca, enquanto que um programa eficaz, que pode ser aplicado imediatamente de forma segura e acessível, pode reduzir 40% a infecção de Aids.

Lembrem-se que os bilionários ocidentais não acumularam fortunas graças ao desejo genuíno de ajudar. Na África milhões de pessoas morrem, enquanto os senhores dos fármacos ocidentais e seus acionistas terroristas financeiros colhem seus milhões de dinheiro ensanguentado. Enquanto isso, os verdadeiros heróis da saúde pública na Eritreia estão lutando para salvar a vida das pessoas.

Não pense, então, que Bill Gates está fazendo algum bem quando doa 10 bilhões de dólares na pesquisa de vacinas, muito pelo contrário. E não se esqueçam que em relação ao que concerne à implicação dos EUA na África, nenhuma boa intenção fica impune e, novamente, a Eritreia está sob sanções do Conselho de Segurança da ONU.*

Fonte: Casa das Áfricas* N. de T.: Ver “¿Quién demoniza Eritrea y por qué?”, Mohamed Hassan, http://www.rebelion.org/noticia.php?id=100387

Thomas C. Mountain era, em outra vida, educador, ativista e professional de saúde alternativo nos EUA. Email: thomascmountain@yahoo.com.

Fonte: http://alethonews.wordpress.com/2010/02/24/bill-gates '-10-bilhão de vacina-scam /Online JournalTraduzido do Inglês para Rebelión por Beatriz Morales BastosTraduzido do espanhol para o português por Casa das Áfricas

'O desenvolvimento nos trouxe a fragmentação do tempo, a anulação da história...'
Achille Mbembe

A maioria das agências humanitárias ocidentais têm uma noção simplista do que significa "África" e do que é o "desenvolvimento". Não são conscientes, ou ignoram tudo o que gerou a crítica recente do desenvolvimento, enquanto ideologia e prática, e agem como se essa crítica nunca tivesse sido formulada.

O fato é que no terreno, onde muitos de nós vivem e trabalham, o paradigma do "desenvolvimento" morreu. Isto pode ser constatado a cada dia na prática e nas ações das pessoas comuns. Mas a "máquina desenvolvimentista" continua viva, pagando generosamente a especialistas, intermediários e consultores, gastando copiosas indenizações aos seus clientes locais, seus auxiliares e agentes. A "máquina desenvolvimentista" continua funcionando em vão, o que é ainda mais preocupante já que este vácuo produz esbanjamentos consideráveis.
Além disso, a maioria das agências doadoras ocidentais consideram agora a África como uma zona de emergência, um terreno fértil para as intervenções humanitárias. O futuro não faz parte de sua teoria sobre a África (nas escassas exceções onde esta teoria existe). Para estas agências, a África não é apenas uma terra de empirismo, mas também uma terra enraizada no eterno presente, no acúmulo em série de "instantes" que nunca atingem a densidade e peso do tempo humano, histórico. É um lugar onde o "aqui e agora" é mais importante do que o amanhã, para não falar de um tempo distante no futuro ou da esperança.
Foi isso que nos legou a natureza temporária do 'desenvolvimento': a fragmentação do tempo, a anulação da história, enquanto futuro e nossa prisão mental em um tipo de restrição baseada no imediatismo e no niilismo sem fim. Este impulso caótico e agressivo também é particularmente inquietante.

[...] Detesto a idéia que faz da vida na África um simples desapego: o de um estômago vazio e um corpo nu à espera de ser alimentado, vestido, curado ou alojado. É um conceito arraigado na ideologia e na prática do "desenvolvimento" e que vai totalmente ao encontro da experiência pessoal cotidiana das pessoas com o mundo imaterial do espírito, especialmente quando se manifesta em condições de precariedade extrema e de uma insegurança radical.
Este tipo de violência metafísica e ontológica tem sido durante muito tempo um aspecto fundamental da ficção do desenvolvimento que o Ocidente tenta impor àqueles que colonizou. Devemos nos opor e resistir a formas tão hipócritas e desumanizadas.

[...] Quando eu era diretor executivo do Conselho para o Desenvolvimento da Pesquisa em Ciências Sociais em África (CODESRIA), eu tinha de manter relações com os fornecedores de fundos públicos na França, Japão, Holanda, agências das Nações Unidas e, especialmente, com os países nórdicos. O relacionamento dependia do calibre intelectual e diplomático das pessoas com que fazia contato. As reuniões mais criativas aconteceram com aqueles que acreditavam que o destino da África estava ligado inevitavelmente com o do resto do mundo. Eles concordavam que uma intervenção criativa e eficaz no continente passava por um conhecimento sério, prolongado e detalhado do país, assim como pela análise e espírito crítico. Com interlocutores assim, frequentemente conseguimos programas criativos e inovadores.

Deixando de lado esses casos, o cenário geral era deprimente. Estávamos constantemente a ter de lidar com burocratas cínicos, pessoas que odiavam profundamente a África, mas que se tornaram dependentes, até tirar proveito de seus prazeres perversos. Custava-lhes livrar-se dessa dependência, e interagiam com o continente do mesmo modo que as pessoas presas em uma relação abusiva. Nem eles acreditavam no catecismo do "desenvolvimento" que pregavam. Eu vivi algumas dessas reuniões como uma primeira visita a um manicômio, frente a pessoas que haviam fracassado ou que nunca poderiam fazer uma carreira honrosa fora da África. Não precisavam de pensar, porque para eles a África era simples. Na verdade, se mostravam muito hostls a qualquer coisa que se assemelhasse a uma idéia.

Ainda mais desconcertante era o pressuposto implícito, particularmente nos países do norte, de que os africanos poderiam expressar-se apenas como vítimas. Ao manifestar a sua solidariedade peos conflitos na África, muitos países ocidentais, infelizmente, perpetraram essa sensibilidade vitimista que alguns intelectuais e políticos africanos propagam desde sempre, embora tentando disfarçá-la com uma aparência anti-imperialista.

Por exemplo, têm tolerado a mediocridade e apoiado, no discurso sobre ciências sociais africanas, a predominância fatal do populismo e do radicalismo. Gastaram (acho que eles ainda estão fazendo isso), milhões de dólares por ano para manter enormes organizações administrativas ineficazes, que deveriam ter sido fechadas há muito tempo e nas quais um número incalculável de intermediários se beneficiam da imunidade diplomática e ganham um salário equivalente àqueles que trabalham para as estruturas das Nações Unidas. Esta forma de paternalismo condescendente tem, é claro, raízes muito consistentes no racismo.

Fonte: Casa das Áfricas (a partir do espanhol em Oozebap)
Estas reflexões fazem parte de uma entrevista mais extensa realizada a Achille Mbembe por Vivian Paulissen e publicada no Africultures (2 de Dezembro de 2009) sob o título "Art contemporain d'Afrique : négocier les conditions de la reconnaissance”. Disponível em Africultures.