quarta-feira, 5 de outubro de 2011

LEI N. 3, DE 27 DE MARÇO DE 1861

Antonio José Henriques, do Conselho de Sua Magestade O Imperador, e Presidente da Provincia de S. Paulo etc. Faço saber a todos os seus habitantes que a Assembléa Legislativa Provincial, decretou e eu sanccionei a Lei seguinte : 

Art. 1.º - Os senhores, que possuirem escravos, de que se não tenha pago a meia sisa, pagarão dentro do praso de um anno na collectoria de sua residencia, o imposto de vinte mil réis, de cada um, embora não exhibam titulo. 

Art. 2.º - Na estação fiscal, em que se pagar o novo imposto de vinte mil réis, dar-se-ha ao senhor do escravo um documento do qual conste a idade, estado, naturalidade, e residencia do escravo. 

Art. 3.º - Ficam isentos da meia sisa em divida, os que pagarem no praso marcado o referido imposto. 
Mando portanto a todas as Auctoridades a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir tão inteiramente como n'ella se contém. O Secretario desta Provincia a faça imprimir, publicar e correr. Dada no Palacio do Governo de S.Paulo aos vinte e sete dias do mez Março de mil oito centos e sessenta e um. 

(L. S.) ANTONIO JOSE' HENRIQUES.

Carta de Lei pela qual Vossa Excellencia manda executar o decreto da Assembléa Legislativa Provincial, que houve por bem sanccionar, mandando que os senhores, que possuirem escravos, de que não tenham pago a meia sisa, pagarão dentro do praso de um anno na collectoria de sua residencia o imposto de vinte mil réis de cada um, embora não exibam titulos, como acima se declara. 

Para Vossa Excellencia vêr 

Benedicto Antonio Coelho Netto a fez. 

Publicada na Secretaria do Governo de S. Paulo aos vinte e sete dias do mez de Março de mil oito centos e sessenta e um. 

João Carlos da Silva Telles. 

Registrada á folhas 249 do Livro competente. Secretaria do Governo de S. Paulo 27 de Março de 1861. 

J. Ghirlanda.
Lei n° 19, de 05/03/1885

O doutor José Luiz do Almeida Couto, commendador da ordem de S. Gregorio Magno, e presidente da provincia de S. Paulo, etc, etc. 
Faço saber a todos os seus habitantes, que a assembléia legislativa provincial decretou e eu sanccionei a. lei seguinte: 

Art. 1.º - Cobrar-se-ha do cada escravo o, existente na provincia, o empregado na lavoura o imposto de 1$000 por anno, sendo o produto desse imposto applicado ao serviço da immigração. 

Art. 2.º - De cada escravo, existente na provincia, e que não se empregar no serviço da lavoura, se cobrará o imposto annual do 2$000, que reverterá para o fundo de emancipação, distribuido pelos municipios, onde existirem os mesmos escravo. 

Art. 3.º - As reduções feitas pela presente lei, as de n. 25 e 26 de 28 de Março da 1884, aproveitarão aos contribuintes no corrente exercicio, devendo o presidente da provincia mandar restituir-lhes a differença ou excesso do imposto que já houverem pago. 

Art. 4.º - O governo expedirá regulamento para execução desta lei, não devendo os exactores da provincia perceber porcentagem das taxas que, arredadarem.
 
Art. 5.º - Revogam-se as disposições em contrario. 
Mando, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida lei pertencer, que, a cumpram e façam cumprir tão inteiramente como nella se contém. 
O secretario d'esta provincia a faça imprimir, publicar e correr. 
Dada no palacio do governo da provincia de S. Paulo, aos cinco dias do mez de Março, de mil oitocentos e oitenta e cinco. 
DR. JOSE' LUIZ DE ALMEIDA COUTO. 

(L. S ) 

Carta de lei pela qual vossa excellencia manda executar o decreto da assembléa legislativa provincial, que houve por bem sanccionar, creando o imposto de 1$000 sobre cada escravo empregado na lavoura e de 2$000 sobre os não empregados, como acima se declara. 
Para vossa excellencia ver, Antonio Pedro de   Oliveira, a fez. 
Publicada na secretaria do governo da provincia de S. Paulo, aos cinco dias do mez de Março de mil oitocentos e oitenta e cinco. 

Daniel Augusto Machado

domingo, 28 de agosto de 2011


Anemia falciforme é discutida em audiência pública

Uma a cada 380 crianças nascidas vivas é portadora da anemia falciforme nas Américas. Segundo o Ministério da Saúde (MS), a cada ano o Brasil registra cerca de três mil nascimentos de crianças com a doença que afeta especialmente negros. A situação é considerada pelo MS um problema de saúde pública devido à grande parte da população do país ser negra e mestiça. Em audiência realizada no Senado Federal, na última quarta-feira (24), senadores debateram sobre incidências, qualificação para o atendimento de pacientes e a divulgação da doença para conhecimento da sociedade.

Solicitada pelos senadores Lídice da Mata, Paulo Paim (PT-RS) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), a audiência foi promovida pelas Comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado.

Joice Aragão de Jesus, coordenadora da Política de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme do MS, destacou que a enfermidade atinge uma parte da população que, além de negra, é mais vulnerável: mais pobre, que não tem acesso a uma série de serviços e com menor grau de escolaridade.

Prevenção e combate - De acordo Joice, é grande a necessidade de uma campanha de conscientização para que as pessoas saibam o que é e como conviver com a doença. “A anemia falciforme é hereditária e não tem cura, mas existem tratamentos que dão ao doente o direito a uma vida com qualidade e que proporciona à família maior segurança”, afirmou a médica que aposta no avanço da ciência em relação a tratamentos para a doença.

A senadora Lídice da Mata (PSB-BA) propôs a criação de um cadastro nacional que possibilite estratégias governamentais e acompanhamento médico mais adequados a fim de reduzir os índices de mortalidade. Os dados sobre a doença no país ainda são precários, porém o MS aponta que a letalidade para crianças portadoras até cinco anos de idade é de 80% quando não há tratamento algum, e de 1,8% quando há o tratamento.

Racismo Institucional – Representante da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Anhamona Silva de Brito, e Altair Lira, coordenador geral da Federação Nacional das Associações de Doenças Falciformes, defenderam durante o encontro que o racismo institucional está entre as razões que explicam a demora do governo em priorizar nas políticas públicas, uma doença que afeta parcela significativa da população. “A doença que foi descoberta há um século e ainda não se sabe exatamente o que é. Isso comprova o racismo institucional que há na saúde”, ressaltou Lira que é pai de uma menina portadora da doença.

Zezé Mota, que esteve na audiência comentou de seus esforços para divulgar a questão na mídia. Sem sucesso nas tentativas, a cantora e atriz lamentou a falta de interesse dos meios de comunicação em divulgar um problema que a sociedade brasileira mal conhece.

Histórico e incidências – A anemia falciforme é herdada dos pais. É uma doença incurável, decorrente de alteração sofrida pelo código genético. A coordenadora da Política de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme do MS, explica que a mutação faz com que as hemáceas (células vermelhas do sangue) percam sua sustentabilidade e, assim, sua forma redonda, assumindo o formato de foice, o que explica o nome da doença. A dor e a anemia aguda são os principais sintomas.

Estado brasileiro com grande número de ascendentes de africanos, a Bahia tem o maior percentual de casos, registrando um portador para cada 650 crianças nascidas vivas. Outros estados com as mais altas incidências são Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco e Maranhão.

Originária da África, a anemia falciforme foi uma mutação para adaptação à questões ambientais ocorridas que vitimou os povos do continente. Com a diáspora, se espalhou pelo mundo e se tornou herança genética nas populações afrodescendentes da Europa, Índia, Estados Unidos e América Latina. Para se ter idéia da proporção por continente, enquanto no Brasil nascem três mil portadores por ano, na Nigéria nascem 86 mil no mesmo período, seguido de Congo e Serra Leoa.

Teste do pezinho – Ferramenta fundamental para a segurança do bebê e da família o “teste do pezinho” tem sido uma importante ferramenta na triagem neonatal. Por meio do método, é possível o diagnóstico precoce da enfermidade e de outras doenças, o que permite que a doença, apesar de incurável, seja tratada de forma adequada logo que a criança nasce, evitando uma série de complicações e a morte.

Na proposta da senadora Lídice, o “teste do pezinho” poderia servir de instrumento ao cadastro nacional de informações sobre a doença. Joice, do MS esclareceu que 18 estados do país já oferecem gratuitamente o exame no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) para detecção da anemia falciforme. Nos outros estados o teste gratuito existe, porém não inclui a enfermidade entre as doenças diagnosticadas.

Fonte: Palmares (Daiane de Souza)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011


Com comércio em alta, Brasil e África desenvolvem parceria com ganhos para todos

A corrente de comércio entre Brasil e África atingiu a marca de 17 bilhões de dólares em 2009. Porém, a relação entre brasileiros e africanos vai além disso, envolvendo parcerias para desenvolvimento e capacitação. Neste contexto, representantes de 14 países discutem o papel da propriedade intelectual para ampliar mais esta relação, inclusive em setores econômicos de ponta.
As discussões fazem parte do Encontro Inter-Regional Brasil - África de Propriedade Intelectual para o Desenvolvimento Econômico. O evento é promovido por uma parceria entre o INPI e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), com apoio do Ministério das RelaçõesExteriores (MRE). O evento ocorre entre os dias 19 e 20 de agosto, em Salvador (BA).
Na abertura do evento, os debates focaram a cooperação entre as instituições nacionais de propriedade intelectual para garantir agilidade e qualidade na concessão de direitos, além de ampliar o ensino e a pesquisa sobre o tema. Isso estimularia o uso do sistema de PI por pesquisadores e empresas, que também podem fazer parcerias entre si.
Desta forma, para o presidente do INPI, Jorge Ávila, e o vice-diretor geral para Cooperação e Desenvolvimento da OMPI, Geoffrey Onyeama, a colaboração é importante para gerar um sistema de propriedade intelectual que contribua para a inovação e o desenvolvimento de todos.
Neste sentido, o assessor internacional do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) José Mauro Couto, lembrou que a intenção brasileira é constituir parcerias de longo prazo com o continente africano, incluindo transferência de tecnologias e know how.
Alguns exemplos reforçam este modelo. A Embrapa, por exemplo, possui projetos com diversos países africanos, como Angola, Moçambique, Gana, Gabão e Nigéria, entre outros. E a tendência é ampliar ainda mais os acordos, já que o mundo tem cerca de 14 milhões de hectares disponíveis para agricultura, boa parte deles na América do Sul e na África. Neste processo de desenvolvimento conjunto, a propriedade intelectual é um requisito decisivo.
Já a Fiocruz, que possui escritório em Moçambique, realiza ações de capacitação de pessoal e de intercâmbio técnico-científico, especialmente nos países de Língua Portuguesa. Umdos projetos de cooperação está voltado para o combate à Aids.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011



‘Sentem fome, mas não pedem
comida o tempo todo’



Os somalis não possuem a mesma noção de fome que temos no Brasil”, conta a pediatra carioca Luana Lima, em uma conversa com o site de Carta Capital, por telefone, do campo de refugiados de Dadaab, no Quênia. O local recebe um intenso fluxo de refugiados da Somália em busca de alimentos e ajuda médica, somando 440 mil pessoas e com previsão para alcançar 550 mil até o fim do ano.

Quatro entre dez crianças de até cinco anos que chegam a Dadaab estão desnutridas. Veja relato de médica carioca que está no local. Por Gabriel Bonis Foto: Brendan Bannon

“No hospital, oferecemos alimento oito vezes para uma criança. Então a mãe dela me disse que seu filho não precisava comer tudo aquilo e que deveria dividir com os outros”, lembra a pediatra, que trabalha na unidade de tratamento de desnutrição do hospital da organização internacional Médicos Sem Fronteiras.


“Eles nunca foram acostumados a ter comida e sua dieta é diferente, então não chegam a ter essa noção de que não possuem tanta comida. Logicamente, sentem fome, mas não pedem comida o tempo inteiro”, explica.

Nos campos de Dadaab, após serem registrados em postos de controle, os refugiados recebem alimentos – providenciados pelo Programa Mundial de Alimentação da ONU – de acordo com os casos clínicos: crianças mal nutridas ganham mantimentos específicos com maior valor calórico e acompanhamento de “agentes comunitários”, que visitam as tendas também colhendo dados.

Essas informações serão compiladas em uma pesquisa do MSF, que ainda não tem níveis de mortalidade no campo disponíveis. “Precisamos saber o que está acontecendo, porque acreditamos que mais pessoas do que podemos alcançar estão morrendo. Precisamos nos focar em salvar vidas e nas formas de alcançá-las”, afirma a coordenadora médica da missão da MSF em Dadaab, a espanhola Natalia Cobo.

No local, a organização está fornecendo tratamento médico em dois dos quatro campos de refugiados, mas a condição está piorando. Cobo chega a comparar a situação no Quênia com a dos deslocados internos em Darfur, no Sudão, onde esteve em 2005 e 2008. “Em Darfur, tínhamos apoio psicológico para a população, laboratórios, enfim, era um hospital completo. Aqui, a dimensão das necessidades é muito alta. Estamos falando de quase 400 mil pessoas, é quase uma cidade”.

Uma configuração populacional que traz problemas comuns aos grandes centros urbanos, como a violência, a um local já atingido pela miséria. “Sabemos que há alguns bandidos em volta dos campos e há violência. Sabemos que no caminho homens estupram mulheres, além disso, nos extremos do campo é difícil controlar esses casos”.

Acompanhe abaixo mais imagens do campo de refugiados em Dadaab:



Refugiados da Somália se acumulam na entrada do centro de recepção em Dadaab. Foto: Michael Goldfarb



Com os campos lotados, refugiados somalis fazem assentamento improvisado. Foto: Michael Goldfarb



Cerca de seis mil pessoas chegaram ao campo de refugiados de Dadaab na segunda semana de agosto.


Foto: Michael Goldfarb/MSF

Paciente é examinado no centro de alimentação terapêutica no hospital de um
dos campos de refugiados de Dadaab. Foto: Michael Goldfarb



Criança sendo pesada em um dos postos de saúde gerenciados pelo MSF em Dadaab. 
Foto:Serene Assir

Enfermaria do centro de alimentação terapêutica no hospital de MSF em Dadaab. Foto: Michael Goldfarb
Em direção ao Quênia, somalis lotam campo de refugiados. 'As tendas aparecem e já não reconhecemos os endereços', conta médica carioca Luana Lima. 
Fotos: Michael Goldfarb/MSF
Fonte: Carta Capital

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

ONU condena País por morte de grávida

Para entidade, Brasil violou direitos humanos de gestantes; mulher de 28 anos morreu em 2002

O Brasil foi condenado pela Organização das Nações Unidas (ONU) por violar direitos humanos de grávidas. A determinação foi divulgada ontem pelo Comitê para Eliminação da Discriminação contra Mulheres (Cedaw, sigla em inglês).

O caso que levou a essa decisão é o da brasileira Alyne Silva Pimentel, de 28 anos, moradora da Baixada Fluminense (RJ). Ela morreu em novembro de 2002, no sexto mês de gestação, cinco dias após dar entrada em um hospital público com sinais de gravidez de alto risco não receber atendimento apropriado.

"A Justiça no Brasil nunca deu resposta. O caso chegou à ONU em 2007 e hoje saiu a decisão. O resultado é uma vitória do Brasil e do mundo, já que é o primeiro caso de mortalidade materna analisado internacionalmente", explica Lílian Sepúlveda, vice-diretora do Center for Reproductive Rights, organização que promove os direitos reprodutivos das mulheres no mundo e levou o caso ao Comitê da ONU.

Obrigações. A decisão estabelece que o governo brasileiro deve indenizar a família de Alyne, além de garantir o direito das mulheres aos cuidados obstetrícios de emergência, oferecer formação profissional adequada aos profissionais da saúde e punir aqueles que violarem os direitos reprodutivos das mulheres.

Ainda não foi divulgado o valor da indenização nem o prazo para pagamento.

"A decisão é importante, pois combate uma múltipla discriminação, já que Alyne era mulher, negra e pobre", completa Lilian.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), apesar de ter reduzido a taxa de mortalidade materna na última década, o Brasil ainda é responsável por cerca de 20% das mortes de grávidas que ocorrem todos os anos na América Latina e no Caribe. Brasileiras afrodescendentes, indígenas e mulheres solteiras vivendo nas regiões mais pobres são proporcionalmente as mais afetadas pela mortalidade materna.

Em nota, o Ministério da Saúde afirma que o programa Rede Cegonha, lançado em março deste ano com um investimento de R$ 9,4 bilhões, vai ditar ações estratégicas para qualificar uma rede de assistência obstétrica. O objetivo é que a mulher receba assistência integral desde a confirmação da gravidez e até o segundo ano de vida do filho.

Consequências. Quando morreu, Alyne deixou uma filha de 5 anos. Um tempo depois, o pai da criança saiu de casa e formou uma nova família. A criação da menina ficou por conta da avó, Lourdes Silva. "Esperei por nove anos. Eu quase já não tinha esperança de que algo acontecesse."

Após a morte de Alyne, a filha ficou gaga, perdeu o apetite, precisou ser trocada de escola e até hoje recebe atendimento de fonoaudióloga e de psicóloga. Tudo pago pela avó.

Além da determinação da ONU, a família espera decisão da Justiça brasileira que lhe garanta o direito de reparação.

PARA ENTENDER

Era 12 de novembro de 2002, quando Alyne Pimentel Teixeira, grávida de seis meses, chegou à Casa de Saúde Nossa Senhora da Glória, em Belford Roxo, no Rio. Com náuseas, voltou para casa com a prescrição de um remédio. Retornou no dia seguinte ao local e foi internada. Uma ultrassonografia mostrou que o feto estava morto e o parto foi induzido. Dois dias depois, a família foi informada de que Alyne tinha hemorragia e não conseguia respirar. Transferida de hospital, morreu no dia seguinte. 

Fonte: O Estado de S.Paulo (Ocimara Balmant )

terça-feira, 12 de julho de 2011

Procuradoria terá cota para negros em estágio

BRASÍLIA
A Procuradoria Geral da República baixou portaria destinando 10% das vagas de seus concursos de contratação de estagiários de nível superior e profissionalizante para negros e portadores de deficiência física. A adoção de cotas em instituições públicas é polêmica e já foi motivo de ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). No Congresso Nacional, está parada na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) proposta de cotas para alunos egressos de escola pública, com subcota para alunos negros
Dezenas de universidades já adotaram as reservas de vagas para alunos afrodescendentes e de escolas públicas. No final do ano passado, o Ministério das Relações Exteriores também criou reserva de vagas para negros na prova de admissão ao curso do Instituto Rio Branco. A partir deste ano, serão aprovados 10% a mais que o número de candidatos. As vagas serão destinadas a negros.


Fonte:planejamento

segunda-feira, 4 de julho de 2011

O Universo Negro Brasileiro em Barcelona


Por Joanna Alves
Com o intuito de promover a reflexão sobre a presença da cultura africana no Brasil, a cidade de Barcelona, na Espanha, receberá, pelo quarto ano, o Ciclo de Conferências e oficinas abertas sobre O Universo Negro Brasileiro.
Entre os dias 06 e 10 de julho, a cidade espanhola acolherá intelectuais, mestres de capoeira, dançarinos e músicos, a fim de expandir os ideais do multiculturalismo, construídos através da diversidade herdada dos ancestrais africanos.
O evento será realizado pela Asociación Cultural de Capoeira Angola Vadiação, que pretende massificar as relações interculturais a partir da percepção da história de cada expressão artística e cultural, fazendo com que as barreiras do preconceito social, racial ou econômico sejam rompidas.
Na programação, o grande encontro cultural afro-brasileiro contará com a participação de representantes da cultura afro em universidades brasileiras, além de videoconferência com o quilombo de Conceição das Crioulas, em Pernambuco, certificada pela Fundação Cultural Palmares.
As oficinas sobre capoeira, maculelê, percussão, dança e culinária afro-brasileiras darão ao público a possibilidade de adentrar neste universo de Sinergias e Convergências das Culturas Negras no Brasil.
Fonte: palmares

sábado, 2 de julho de 2011


QUESTÕES DE GÊNERO

Por: ALEXANDRE VALDEMAR DA ROSA*
* Graduado em História - UNESC
Especialista em História – UNESC
Especialista em Educação Inclusiva – UCB-RJ.

A Cor do Pecado no Século XIX ( A Sensualidade da Mulher Negra)

Resumo
Esta pesquisa tem por objetivo principal analisar a presença do erotismo em torno da mulher negra durante a escravidão, sobretudo no século XIX. Também serão abordados o uso das vestimentas e os diferentes tipos de agressões sofridos por elas nesse período.

Summary
The research's main objective is to analyze the presence of eroticism around the black woman during slavery especially in the nineteenth century. It will examine also the use of clothing and different types of assault suffered by them during this period.

Keywords: Black Women, Sensuality, Sexual abuse, discrimination

INTRODUÇÃO

Pensar em falar de um assunto como o da sensualidade da mulher negra nos tempos escravistas, sobretudo no século XIX é algo realmente desafiador. Isto porque, as informações no que tange esta questão são notoriamente carregas por estereótipos negativos, como se elas tivessem a obrigação de sempre estarem prontamente dispostas a realizar os desejos de seus respectivos senhores, "em todos os sentidos". É crível afirmarmos que o preconceito imposto às negras se deve principalmente ao rebaixamento da condição feminina à de "bestas ou mercadoria sexual". Ou seja, comparada como burros de cargas e induzidas à prostituição, o século XIX, para elas, teria sido um misto de dor e aflição. Além disso, uma série de normas proibia o casamento entre as "duas raças", entretanto, este impedimento não tinha valor algum quando o foco em questão envolvia a prática sexual. Como comenta Chiavenato (1993, p.136) essa "situação levou 'naturalmente' a entender-se como função da negra escrava o satisfazer as necessidades sexuais do senhor: nem sempre isentas de desvios sádicos, quase sempre orientados por um forte sentimento de depravação" .
Enfim, para compreender o quanto a sexualidade da mulher negra foi admirada pelo indivíduo branco num período em que o nosso país ainda era império, é de suma importância atentar sobre esta temática. Sendo assim, boa leitura.


Esta história iniciou-se assim...

Desde os tempos em que o Brasil foi colônia, a imagem da mulher negra sempre esteve atrelada a um imaginário negativo, sobretudo na questão sexual. Ou seja, são muitos os historiadores, romancistas, poetas que retratam- nas ora como trabalhadoras adequadas a serviços desumanizantes, ora como personagens lascivas e promíscuas . Lamentavelmente esse dualismo em torno delas tinha o maior sentido para os escravistas brasileiros. Isto porque, a mesma escrava que em determinado momento era vista como um simples "burro de carga", por outro lado poderia ser a responsável pela iniciação sexual de algum "jovem sinhozinho".
Ao que tudo indica parece que no século XIX a melanina da mulher negra exalava paixão. Talvez seja este o motivo pelo qual Gilberto Freire tenha escrito: da mulata [...] que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama de vento, a primeira sensação completa de homem . Apesar de ser muito criticado por tentar colocar panos quentes sobre o problema da escravidão brasileira, Freire (2003) nos dá importantes informações em torno da sexualidade da mulher negra nesse período. Como foi o caso de um rapaz de família tradicional do sul: este para excitar-se diante da noiva branca precisou nas primeiras noites de casado, de levar para a alcova a camisa úmida de suor, impregnada de bumbum, da escrava negra sua amante .
Este desejo incessante pelas escravas, principalmente as mais jovens, nos faz pensar a maneira pela qual eram realizados os casamentos e porque a noiva se submetia a tal situação.
Segundo Alves (1994, p.36) até o século XVIII, no Brasil, o casamento dito formal, isto é, aquele de papel passado, tornou-se algo raro, pois a maior parte dos casais brasileiros vivia numa total ilegalidade, tanto aos olhos da igreja como na visão do Império. Constam nos trabalhos da historiadora que o índice de concubinatos era anormal: alcançava 80% dos casais na Bahia, mais de 70% no Rio de Janeiro e em torno de 50% em São Paulo . As raríssimas uniões formais ocorriam especialmente entre os membros da elite escravocrata que preocupada com a questão patrimonial e a estabilidade financeira dos filhos, procuravam preservar a tradição.
O alto índice de concubinatos tornava comum nos séculos XVII e ainda no XVIII a troca de parceiros, fazendo com que a mulher brasileira em pouco tempo fosse negativamente estereotipada na Europa. Como já apontamos isso aconteceu justamente durante a passagem de inúmeros viajantes europeus pelo território tupiniquim. Às eles são atribuídos às expressões: degeneradas, muito dadas, sem escrúpulo sexual, leviana e fácil, entre outras. Todos foram unanimes em estigmatizar a mulher, tanto a branca quanto a negra, seja por meio de suas vestimentas, do seu modo de andar, beijar ou até se relacionar sexualmente. Pyrard de Laval, por exemplo, o pioneiro a falar mal da classe feminina brasileira descreveu assim as baianas: "[...] em resumo, as mulheres na Bahia são mais amigas dos estrangeiros do que os homens que, por sinal, são muito ciumentos [...]. sua conduta demasiada 'livre' e sua moral pouco 'austera'" . O francês teria chegado a esta conclusão depois de ter se envolvido amorosamente com várias nordestinas no século XVII.
Compartilhando da mesma opinião de Laval, Cook, dizia também que na capital do império, ou seja, no Rio de Janeiro "não há uma única mulher honesta" . Imagem parecida tinha Dellon e La Barbinais sobre as santistas. O primeiro, além de ter conhecido a cidade paulistana também havia transitado pela Bahia, e sobre ela teria dito:
Desconheço se a libertinagem é, no Brasil, tão generalizada quanto na Bahia de Todos os Santos. Por aqui, mesmo as mulheres que possam ter alguma virtude não têm o menor escrúpulo de adornar suas escravas, para que possam vender mais caro os infames prazeres que oferecem. Pode-se dizer que o vício reina ai soberanamente .
A mudança desse paradigma se fez necessário a partir do momento em que a igreja resolveu interceder a favor da moralidade feminina. Dessa forma, o século XVII foi considerado o período de muitas mudanças, principalmente no cotidiano familiar. A esposa agora deveria, por obrigação, obedecer a regras comportamentais antes inexistentes. Tais normas visavam unicamente "regular o comportamento da mulher de acordo com a elevada missão que compete na sociedade – a de mãe e mestra dos filhos" .
Para exercer esse papel, a figura feminina aos poucos foi sendo lapidada com base na valorização do casamento e respeito à família, preceitos estes fundamentados teoricamente nas escrituras sagradas. "[...] esposas estejam (sujeitas) aos seus maridos, em tudo" . Diante disso, a Bíblia rapidamente foi tida como o instrumento social regulador, porque para ser considerada uma mulher correta aos olhos da igreja era necessário, sobretudo obedecê-la. Sendo assim, do século XVII ao XIX, sobre o olhar eclesiástico quase tudo caracterizava pecado, inclusive o relacionamento sexual antes do casamento. Casar-se virgem ou casar com uma virgem tornou-se uma obrigação.
Para alcançar essa perfeição, comenta Araújo , a verdadeira "mulher direita" precisava vestir-se de maneira exemplar, evitando com isso, que uma sensualidade ostensiva despertasse a libido sexual masculino e o pecado reinasse soberano no território brasileiro. Por outro lado, os manuais de confessionários, que procuravam disciplinar os afagos femininos, transformaram as carícias num meio de punição, logo, beijar no século XVIII se tornou um perigo. Surgia, então, a categorização para os beijos.
Existia o Beijo "com sensação de seda", que se dava no nariz, não era tão sério; purgava-se com cinco pais-nossos e cinco ave-marias, segundos manuais da igreja. Muito mais grave era o beijo com "sensação de veludo", associado ao genital feminino, purgável de joelhos, após um rol maior de orações .
Além de controlar as carícias, a igreja criou todo um imaginário para as relações sexuais, uma espécie de manual em que o marido e esposa deveriam indubitavelmente seguir para não serem taxados de pecadores. Estando na cama "os teólogos e moralistas condenavam o coito com o homem em pé, sentado ou por baixo da mulher, casos em que o esperma procriador poderia dispersar-se ao entrar no lugar certo" . Alegavam ainda, que o homem sobre a mulher seria a única posição permitida, pois elas no imaginário eclesiástico enlouqueciam em cima deles. "Alardeavam que a posição em que a mulher fica de quantro dava origem a crianças aleijadas" .
Esse adestramento dos prazeres da carne imposto pelos religiosos católicos visava um único objetivo, fazer com que o ato sexual não estivesse demasiadamente voltado ao prazer, mas a geração e o aumento substancial da prole. Mesmo sendo considerada a responsável pela criação de uma identidade de submissão para a mulher em relação ao homem, no período escravista, a referida religião não teria executado este plano sozinho; a medicina também fez a sua parte. Nos tempo do Brasil Colônia-Império, "o médico era um criador de conceitos, e cada conceito elaborado tinha uma função no interior de um sistema que ultrapassava o domínio da medicina propriamente dita" . A confiança depositada sobre os mesmos, tanto pela população brasileira quanto pela igreja, faziam deles um forte aliado dos ditos representantes de Deus nesta empreitada. Entretanto, se por um lado à igreja procurava inserir a todo o momento na sociedade escravocrata a ideia de mulher correta, elas por sua vez, também atentavam de alguma forma realizar suas fantasias sexuais. Sobre esse assunto, Foucalt comenta que, no período em que nosso país foi império, o sexo "trouxe consigo interditos e proibições (garantindo) fundamentalmente a solidificação e a implantação de todo um despropósito sexual" .
Araújo demonstrou em sua pesquisa intitulada "A arte da sedução: Sexualidade feminina na colônia" como as mulheres brasileiras conseguiam saciar seus lampejos sexuais. Para ele, do século XVII ao XIX, em alguns casos, a própria igreja transformou-se no reduto do pecado, sendo a missa da quarta-feira de cinzas, por exemplo, o local e a data preferida para a atitude profana. O historiador utilizou as palavras do viajante Gentil de La Barbinais para explicar o referido momento.
[...] nessa noite saem ataviados do que tem de mais magnífico e vão a pé de igreja em igreja aguentar os chicotes dos cavaleiros portugueses. É nessa noite que as filhas guardadas por um pai muito severo perdem o que, durante o ano, projetavam perder. É nessa noite que o senhor dos cornudos vê com prazer aumentar seu império. É nessa noite, enfim que os portugueses celebram seus bacanais .
Em meio a toda essa opressão sexual, algumas mulheres nesse período, especialmente as brancas, optavam ceder aos pudores eclesiásticos do que exercitar sua sensualidade. Tudo isso, resultado de um machismo exarcebado, fruto da submissão cultural portuguesa, onde as meninas já na puberdade eram vistas e ao mesmo tempo tratadas como mero objeto reprodutivo. Ela "[a cultura] é a responsável pela transformação dos corpos em entidades sexuadas e socializadas, por intermédio de redes designificados que abarcam categorizações de gênero, de orientação sexual [...]" . A rede citada por Heilborn, na escravidão era formada pelo estado, Igreja e os médicos, todavia, este entrelaçamento preconceituoso não afetava unicamente a mulher branca, mas, principalmente as negras.
Durante a escravidão brasileira, a mulher negra se fez presente em todas as regiões do nosso território, no entanto, as províncias da Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco por estarem economicamente melhores estruturadas em relação às outras, receberam um contingente maior dessas trabalhadoras. Da África, vieram mulheres das mais diferentes regiões, e etnias: angolanas, naometanas, sudanesas, daometanas, estas eram haúcas, nagôs, bantus, fulas, geges, mandingas, minas que ao desembarcarem no Brasil modificaram definitivamente a estrutura familiar em todos os sentidos. Infelizmente, esta mudança trouxe ainda mais sofrimento para elas, aja visto o alto índice de ocorrências registradas no império, de espancamentos e abusos sexuais. Essa violência, segundo Chiavenato estava embasada na submissão "pela sua própria condição social, 'podia-se fazer tudo' – as negras foram usadas e descartadas quando necessário". Para os historiadores, a beleza e a sensualidade das africanas foram à razão do ciúme de inúmeras sinhazinhas e ao mesmo tempo teria sido o fetiche sexual de senhores sem escrúpulos. Como consequencias: dentes quebrados, amputações de membros, homicídios e outras barbáries.
As qualidades no qual Chiavenato atribui as mulheres da "melanina sensual", isto é, as negras são também descritas por outros "personagens" da historiografia nacional. Para enaltecer ainda mais a beleza da mulher negra no século XIX, faremos uso novamente das ideias do "pai da democracia racial brasileira". No entender freiriano, Minas Gerais teria sido a província que nos séculos XVIII e início do XIX havia recebido o maior privilégio da monarquia brasileira, o de ter entre seus habitantes as mais belas mulheres do continente africano, as minas e as fulas. Foram essas:
Minas e as fulas – africanas não só de pele mais clara, como mais próximas, em cultura e "domesticação dos brancos" – as mulheres preferidas, em zonas como Minas Gerais, de colonização escoteira, para "amigas", "manceba" e "caseiras" dos brancos. Ilustres famílias daquele estado, que ainda hoje guardam traços negróides, terão tido o seu começo nessa união de brancos com negras minas, vindos da África como escravas, [...]. .
Em sua pesquisa Freire elogia também a beleza corporal das escravas da Guiné, Serra Leoa e Cabo Verde enquanto as sul-africanas, por serem detentoras de "nádegas salientes", foram descritas pelo pesquisador como mulheres de verdadeiros "corpos afrodisíacos". Este erotismo transplantado em suas palavras, no século XIX ganhava ainda mais conotação devido à escassez de vestimentas na qual elas estavam submetidas. Ou seja, nesse período, pelo simples fato do seu corpo encontrar-se cotidianamente a amostra, involuntariamente a mulher negra transformou-se numa espécie de símbolo do prazer sexual do homem branco. Sobre a indumentária das escravizadas, sobretudo as maranhenses, um viajante inglês no início do século XIX, comentou: "a nudez do escravo é insuficientemente oculta. Homens e mulheres são despidos da cintura para cima excetuando os domingos e dias santos [...]" . Por outro lado, as escravas sulinas vestiam-se "com uma simples camisola, de uma só peça de fazenda quadrada, enfeitada de franjas"
Joana Maria Pedro a pesquisadora que elaborou o mais completo trabalho sobre a história da mulher catarinense também trouxe importantes esclarecimentos para o presente estudo. Por meio de noticias apresentadas em jornais do final do século XIX e início do século XX, a autora conseguiu perceber imagens atribuídas às mulheres; representações estas idealizadas por jornalistas preconceituosos. Assim como em outras obras de conceituados historiadores, nesta também são apresentadas informações de viajantes europeus.

No tocante as mulheres de Desterro, atual Florianópolis, Saint-Hilaire escreveu:

As mulheres são muito claras [...], têm olhos bonitos, cabelos negros e, [...], uma pele rosada. [...] elas não demonstram o menor embaraço e às vezes chegam mesmo a ter um certo encanto; frequentam as lojas tão raramente quanto as mulheres de Minas (1820), mas quando andam pelas ruas em grupos, colocam-se geralmente ao lado uma das outras, não receiam dar o braço aos homens, e muitas vezes, chegam a fazer o passeio pelo campo. Para sair, elas não se envolvem num manto negro ou numa capa grosa, e se vestem com mais decência e bom gosto do que as mulheres do interior .
As do interior, como cita o francês, eram muito limitadas no entender dele, a fazerem uso de um vestido de chita, acompanhado de um xale; este era feito ora de seda, às vezes de algodão . Já as negras foram despercebidas aos olhos de Hilaire. Talvez o motivo desta invisibilidade seja o limitado número de escravos existentes em terras catarinenses no mesmo período.
Vale resaltar que a primeira noticia relacionada às vestimentas dos escravizados em Santa Catarina é datada de 1763, sendo dita pelo então cronista Dom Pernetty, narrador da expedição de Bounganville. Disse ele: "as negras escravas andavam nuas, a não ser quanto a uma espécie de faixa, larga que lhes ia da cinta aos joelhos" .
Em outro momento, Saint Hilaire enfatiza o grande contingente de prostitutas existentes na capital catarinense do século XIX, alegando que as mesmas faziam uso desses "subterfúgios" para conseguirem angariar vantagens de seus amantes. O reduzido número de homens, somados a limitada economia local, teria sido para ele o grande motivador da procura feminina por esta profissão.
Considerada a atividade profissional mais antiga do mundo, a prostituição foi na escravidão um dos meios encontrados para o escravista obter uma renda extra através da escrava. Ganhou ênfase, no século XIX, os escravos de ganho e as negras ganhadeiras. A comercialização do corpo da mulher negra a partir da década de vinte do século dezenove representou um aumento substancial na renda de várias famílias escravocratas, pois uma ama de leite alugada, por exemplo, rendia o equivalente a dois catadores de café, algo em torno de 600$00 .
Pode-se imaginar que, durante a escravidão essas escravas embalaram e ao mesmo tempo amamentaram os sonhos de muitos cidadãos brasileiros. Nesse sentido, para encontrar uma boa amamentadora negra era necessário ficar atendo aos anúncios dos jornais da época, estes muito presentes nas principais cidades do império brasileiro. Ou seja, a imprensa tornava público o acesso a estes (as) trabalhadores (as).
No dia 22 de setembro de 1827 o primeiro jornal do estado gaúcho, o Diário de Porto Alegre, informava o desejo de um indivíduo em contratar uma ganhadeira: "quem tiver uma ama de leite que seja sadia e saiba tratar crianças e queira alugar, anuncie a sua moradia para ser procurada [...]". . Esta preocupação dos senhores escravocratas com a saúde das escravas ganhadeiras tinha realmente fundamento, visto que entre elas o índice de contaminação pela temidas endemias do amor, especialmente a sífilis e a gonorréia era muito grande. A sífilis chegou ao Brasil através dos portugueses e logo se propagou em nosso território, isto graças a depravação sexual proporcionada pelos mesmos. Ainda na pré-adolescência, diversas meninas negras "sediam" aos abusos de rapazes brancos já sifilizados. Isto ocorria, porque do século XVI ao XIX, acreditava-se na ideia de "que para o sifílico não há melhor depurativo que uma negrinha virgem" .
Paradoxalmente, depois de adultas essas mulheres, infelizmente agiram como uma espécie de formiga do desprazer, levando e trazendo as enfermidades tanto para dentro quanto para fora das senzalas. Embora no século XIX algumas delas conseguissem comprar a liberdade através da prostituição, a grande maioria morria prematuramente de doenças venéreas.


Considerações Finais

A presente pesquisa demonstrou que ao longo do século XIX a mulher negra sofreu uma espécie de aviltamento em sua sexualidade, resultado de estigmas negativos que as acompanhou durante a trajetória da escravatura.
Para Salvador (1987) essa problemática em torno do negro iniciou em 1444 quando os portugueses transportaram os primeiros grupos de africanos da Guiné para o reino português. Iniciava-se assim, o martírio feminino africano, "as mulheres negras viram-se expostas a toda sorte de exploração e degradação, sem a proteção do homem negro, impotente devido à sua condição de escravo" . Sofria-se duplamente, pois, se por um lado existia a aflição provocada pelos senhores muitas vezes sifilizados, do outro, estavam às sinhazinhas cujo sadismo beirava a loucura. Foram inúmeros os dentes, olhos, seios e narizes arrancados para demonstrar com isso a ideia de superioridade.
Em suma, mesmo sendo reduzidas à condição de bestas e em alguns casos destinadas à vida de prostituição, ao que tudo indica, parece que no século XIX, a pele da mulher negra estimulava o prazer sexual do homem branco.


REFERÊNCIAS

ALVES, Januária Cristina. O lado feminino do Brasil colonial. In: ER-2: o espião vira cientista. Revista Super Interessante. São Paulo, Abril, v.79, 1994.
ARAÚJO, Emanuel. A arte da sedução; Sexualidade Feminina na colônia. In: PRIORE, Mary Del; BASSANEZI, Carla. História das mulheres no Brasil São Paulo: Contexto, 2001.
BENTO, Cláudio Moreira. O negro e descendentes na sociedade do Rio Grande do Sul (1635-1975). Porto Alegre: Grafosul, 1976.
CARNEIRO, Sueli. Estrelas com luz própria. In: Presença Negra. Revista História Viva. São Paulo, Duetto, Edição Especial, número 03, 2010.
CHIAVENATO, Júlio José. O Negro no Brasil: da senzala a Guerra do Paraguai. São Paulo: Brasiliense, 1993.
FOUCALT, Michel. História da sexualidade 1: a vontade saber. Trad. Maria Thereza da C.Alburquerque e J.A.Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
FRANÇA, Jean Marcel Carvalho. A mulher brasileira segundo os viajantes. In: Adeus Stalin! Revista História Viva. São Paulo, Duetto, v.72, p.69, 2010.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande & Senzala: formação da família brasileira sobre o regime da economia patriarcal. São Paulo: Global, 2003.
HEILBORN, Maria L. Construção de Si. Gênero e sexualidade. In: Sexualidade : o olhar das ciências sociais. Rio de Janeiro: Zahar, 1999.
MAESTRI FILHO, Mário. A servidão negra. RS: Mercado Aberto, 1988.
PEDRO, Joana Maria. Mulheres honestas e mulheres faladas. 2.ed. Florianópolis-SC: Editora da UFSC, 1998.
PRIORE, Mary Del. Magia e medicina na colônia: o corpo feminino. In: PRIORE, Mary Del; BASSANEZI, Carla. História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 2001.
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem a Curitiba e Província de Santa Catarina. Trad. Regina Regis Junqueira. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1978. In: PEDRO, Joana Maria. Mulheres honestas e mulheres faladas. 2.ed. Florianópolis-SC; Editora da UFSC, 1998.
SALVADOR, José Gonçalves. Os magnatas do tráfico negreiro: séculos XVI e XVII. São Paulo: Pioneira, 1987.
TAUNAY, Alfredo D"Escragnole. "Santa Catarina nos anos primeiros", Anais do Museu Paulista, Tomo IV, p.252. In: PIAZZA, Walter F. O escravo numa economia minifundiária. Florianópolis: Editora da UFSC, 1975.
TRADUÇÃO do Novo Mundo das Escrituras Sagradas. Efésios (5;24). Traduzida da versão inglesa de 1984, mediante consulta constante ao antigo texto hebraico, aramaico e grego. Revisado em 1986.
ARAÚJO, Emanuel. A arte da sedução; Sexualidade Feminina na colônia. In: PRIORE, Mary Del; BASSANEZI, Carla. História das mulheres no Brasil São Paulo: Contexto, 2001. In :Ewbank, Thomas. A vida no Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia.São Paulo: Edusp, 1976.
Fonte: Gelédes